O dragão no mar da sabedoria

Eu queria ter te conhecido antes. Sempre penso nisso quando lembro que passei um ano estudando na mesma sala que você sem nem saber seu nome, acho que nossas crianças interiores machucadas se identificam de uma forma irmã que precede essa existência. O mesmo signo, quase o mesmo mapa do horóscopo e do oráculo do Tzolkin. Só que eu a essência do Enlaçador de mundos (Morte), você o Dragão (Nascimento).

Mas em missão temos a mesma energia do KIN do Humano (Sábio) do Tzolkin e o mesmo desafio da fala, o mesmo oculto do mar, o mesmo apoio da avatar, inclusive você é o número do KIN exato da saudosa cantora do Duo Roxette.

Acho tão irônico essas coisas da vida, como quando deixamos de conviver com pessoas que estão ali, cinco cadeiras à esquerda (estou chutando, poderiam ser 4 ou 6). Conhecer mais uma pessoa? Não consigo fazer isso mais não, “estou num momento de desgaste muito grande com minhas amizades”.

E hoje eu preciso dizer que valeu tanto te conhecer, muito mais que a pena. E não é só sobre o seu bom gosto musical (na minha opinião, há quem diga que seu gosto musical é péssimo), ou literário (sempre adorei os empréstimos da sua biblioteca). E eu estou proclamando essa amizade de volta, e eu não aceito mais que conversas em corredores e mesas de bares  usem meu nome ou o seu pra profanar algo que sempre foi tão genuíno.

Gosto muito das suas gesticulações, eu poderia olhar para suas mãos e entender o que você está falando sem ouvir sua voz. E mesmo quando em silêncio e de mãos abaixadas, o vinco na testa, a curvatura das sobrancelhas, o bico, seus humores e conceitos estão estampados na sua face. Eu vejo você dizendo “eu não acredito nisso” com os olhos, “meu deus do céu” com as sobrancelhas fazendo um ângulo distinto, “não aguento mais” com a postura da boca, tão sutil... e ao mesmo tempo um canhão.

Sabe a sua fixação pelos dentes do tubarão? (não sei se ainda persiste). Antes eu acreditei que você era a caça, o alimento do predador, que haveria de empunhar os dentes em suas costelas e fraturá-las pouco a pouco em deleite.

Depois de um tempo, me convenci  que você era o próprio tubarão, pronta para o ataque, para o embate. Pronta para qualquer coisa, mas hoje eu sei você não é nem caça e nem caçador. Você é o próprio mar, sim, o mar, a casa da presa e do predador. Você é um mar cheio de tesouros e lugares escondidos, vidas das mais diferentes espécies, encantos e uma das literaturas mais sensíveis que já li e a escritora de rascunhos doídos mais inteligente que eu já tive a honra de conhecer.

Você é um mar de metáforas, distribuindo-as nas suas palavras assim como as estrelas-do-mar são levadas a areia, cuidadosamente enfeitando a orla de praias. Você enfeita sua vida em enigmas, faceiramente você sabe onde acomodar cada estrela. Você é um mar.

Você me disse uma vez que sua cor preferida era cinza e hoje associei você a Santos, um mar azul acinzentado e poderoso que resiste em ser lindo, mesmo com tanto lixo que jogam nele.

Você funciona como um elo que vai achando pessoas e as unindo e encaixando (e desencaixando) num quebra-cabeça que embora pareça completo, sempre cabem mais peças. Aos meus olhos sua alma é vermelha como o monumento bonito da praia de santos, como um Dragão, que representa tanto a calma quanto a profundidade inquieta do seu olhar, a sabedoria da sua escrita, a cura do seu abraço amistoso no pátio da faculdade. A Doutora por merecimento mais humilde que eu já encontrei.

Meu sonho é ver você fazer que nem o Mar de Santos faz com o lixo que jogam nele, devolver e falar "comigo não"! Você também não pode enganar o espelho minha querida amiga, você é mais fogo que cinza.

Eu saí da janela e você? Quando vai subir no palco e honrar você mesma?

 

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